domingo, 9 de dezembro de 2012

Desabafo


          Eu fui criado há quatro anos, quando haviam muitos que já eram remunerados com isso. Nasci de uma vontade louca de me comunicar, mostrar aos outros um pedacinho do mundo de uma forma singular, tão simplória e ao mesmo tempo admirável. Notei que dois anos após a minha criação, passei a ter meu próprio estilo, minha personalidade e um jeito todo especial de ser. Fui elogiado por muitos e fiquei até um pouco popular entre os companheiros mais próximos, que compartilhavam comigo uma linha de pensamento semelhante. Gostei de parecer importante por uns tempos, mas ultimamente estive um pouco sozinho, não recebi muitas visitas e até achei que pudesse ser exterminado por tamanha rejeição. Entendo todos os motivos, contudo, gostaria que minha maneira de se expressar não fosse deixada em um canto qualquer com a perspectiva que cultivei ao longo desses últimos quatro anos de existência. Apesar de ter iniciado meus registros há apenas dois anos, até encontrar meu verdadeiro ideal, já esperava que logo mais voltaria para vivificar os plantios de outrora cultivados nas sedentas terras dos respeitáveis blogueiros. Ass. Nobres rabiscos. Singelas obras.

terça-feira, 31 de julho de 2012

Pudorasmo

         O pecado bate na porta de quem foge dele, a perseguição nasce de uma ferrenha negação, uma luta contra o ego, o querer interior, chamado também de “falso livre arbítrio”. Há muito tempo o prazer foi confundido com transgressão e muito se passou até que as pessoas descobrissem, não só o caminho da felicidade, mas a felicidade plena. Finalmente a alienação caiu por terra e se tornou do conhecimento de homens e mulheres que ambos podem satisfazer os desejos carnais sem deixar máculas em seu histórico de vida, ou mesmo viver o melindre de um arrependimento efêmero. Feliz 31 de julho, o Dia Mundial do Orgasmo! Prazer e júbilo para todos!

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Ig, ig, urra!


           A ignorância é tão interessante quando não está associada a comportamentos como a rudeza, grosseria, estupidez e boçalidade. Ela chama muita atenção quando conectada a falta de saber e de conhecimento, pois apenas reforça uma característica resistente de quem não se interessa por novas informações e se limita ao cabresto das teimosias reprimidas. Forçadamente controla a raiva que deixa transparecer vermelha na face pálida e desnutrida, apesar do elevado tamanho, o que faz da ignorância ser o que é, trazendo todos os rudes comportamentos à tona. Em determinado momento chega a merecer certa compaixão pela voz exaltada e balbúrdia psicológica, porém, a maldade intencional quase sempre corrompe o sentimento de misericórdia. Aquela raiva de outrem agora é sua com maior vigor e levianamente se apodera de um novo portador.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Selvageria concentrada


      O mundo mudou. Ele está realmente assustador e muitas das coisas são amedrontadoras, inclusive saber que o número de pessoas é muito maior. As terras estão gritando, os animais se refugiam, mas não podem combater contra a brutal e avassaladora força do homem e seus pesados artefatos. Tocas foram soterradas, ninhos estão caídos, cavernas exploradas desabrigam inofensivos morcegos, peixes estão sedentos e o pasto já não doa alimento necessário para famílias de quadrúpedes. A fauna e a flora se despedem num canto tristonho e temem não mais ganhar liberdade para governar a natureza. Poucos lutam pelos interesses do bem comum, pela preservação desses incríveis seres que até hoje nos concederam o sustento e nos alegram cada dia com a sua beleza e majestade ímpar que só a originalidade poderia oferecer. Um nó paira na garganta ao ver que muitos desses seres são conduzidos pelo instinto. Reféns dos seus invejáveis faros, cobiçada audição e contemplada visão mesmo na escuridão, caem no engano e atrás das grades de uma infame gaiola. Mentes estressadas, a liberdade se faz nula nas garras do medo e da dor que sentem ao sair de seus habitats não mais naturais. A superioridade humana está a uma distância pouco longe da ruína e da morte.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Nota do tempo de um voo contido


          O cálice das verdades interiores molhou sua garganta e amargou toda sua boca. Com os olhos fechados seu corpo derretia no calor e caía aos pedaços. As narinas cada vez mais irritadas não suportavam a entrada de tanto ar. Mãos e costas encolhidas e um choro inconsolável tomaram o seu ser. Os dentes doloridos já não faziam mais parte daquela boca e as pernas estavam submersas na intensa frieza das águas. Seu ninho era frio e lhe fazia tremer toda a carne, inexplicavelmente já perdera todos os sentidos humanos, passando a escutar como aves e se perturbar com todo e qualquer ruído que chegasse aos seus sensíveis ouvidos. Suas penas ainda pequenas estavam molhadas e uma breve crise de riso se estampou no rosto. Já estava na hora de amargar a boca novamente quando seu estômago esquentou e num movimento abrupto veio a necessidade de expelir o vômito da cura. Sua vontade era de voar, mas algo prendia suas asas nos pensamentos racionais que lhe vinham negar a experiência da mutação. Ao impedir sua força interior entrou em transe e passou a ter densas visões de animais e insetos que nunca havia visto na vida racional, todos os que passavam por perto possuíam olhos, muitos olhos a olhar a ave que não tinha descoberto a maravilhosa liberdade plena por meio do voo. Outra vez sentiu o poder da cura e expeliu um viscoso vômito do pranto reprimido. Precisou de ajuda para se libertar das garras do perigo em meio aos calafrios e tremores de seu corpo, logo ouviu uma voz apaziguadora e solícita aos seus suspiros temerosos. Essa mão auxiliadora foi ao seu encontro, despertando sua alma do distante sono de embriaguez que aos poucos voltava para luz. Logo veio a aurora boreal e pigmentos violetas despontaram por entre todos os irmãos. Deitou-se e percebeu que seus sentidos humanos retornavam e muito tempo se passou até que sentisse o habitual calor em suas pernas. Regressou de sua viagem e permaneceu meditando no entorpecimento e em tudo o que havia acontecido por meio do cálice de poder.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Intangível crisálida


           Lá fora já não pertence mais aos prisioneiros. Na condição de sua inatividade, a discreta casa é muito admirada pela resistência, porém é demasiadamente incômodo permanecer em suas dependências. Um estágio de desenvolvimento que talvez seja compreensível, se bem que a reclusão quase não faz bem para ninguém, mas no caso das mariposas e borboletas é diferente, por ser uma mudança radical em suas vidas. Passar do rastejo para o voo é sem sombra de dúvidas um mérito louvável. Quem sabe um casulo obsoleto possa ter o mesmo fado de concluir a incrível metamorfose e acordar batendo asas, libertando-se de todos os invólucros medonhos da terrível e mimada vontade de cair em prantos.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Sagrado júbilo


Idas e vindas,
Permanência satisfatória.
Anjos alados na mesma sincronia,
Gotas sem cores sobre a face da alegria.

Amor que irrompe,
Transborda em claras águas.
Enobrece sentimentos mútuos
Derrama e encharca.

Nas veias de antigas mágoas
Serpenteiam sangue de novas sagas,
Intenções, novos sonhos e caminhos,
Por onde percorrem sorrisos contínuos.

Dos suspiros de liberdade,
Sorriem tão felizes que são.
Passeios distintos de confiança,
Adiam um combate vão.

Lágrimas traduzem canções
De puro contentamento e entusiasmo,
Regozijo e exultação dessa imensa alegria.
Pois ter um ao outro é não ter ninguém.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Articulação engessada


          Portão afora, caminhei pelo asfalto feito para rolagem de inúmeros pneus. O vento não era congelante como deve ser em lugares de temperaturas extremamente baixas, mas estava frio o bastante para deixar a face gelada. Garoava um pouco e atravessar a rua foi uma das tarefas mais fáceis pela manhã. A dificuldade começou depois que os compartimentos articulados chegaram na parada que é a segunda mais próxima da casa onde moro. Portas adentro, logo percebi que seria uma manhã difícil por terem muitas pessoas amontoadas atrás da catraca, o que me fez desistir de tentar passar para o outro lado. Ligeiramente me encostei no lugar onde abrigaria uma cadeira de rodas, sim, para minha sorte era um ônibus de piso baixo. Saberão porque tive sorte assim que perceberem o motivo desse post. Desagasalhei um livro, maravilhoso por sinal, e continuei a leitura que já avançava para a metade. Conforme o veículo andava, a articulação se enchia e ficava cada vez mais difícil se locomover. Depois de quase uma hora, agasalhei de volta o livro querido, pois faltavam dois pontos para chegar na parada em que eu desceria naquele dia. Fiz um verdadeiro contorcionismo para chegar até a catraca. Nesse momento, percebi que pessoas são como o gesso, petrificadas e não flexíveis o bastante para colaborar. Consegui atravessar a catraca, mas o gesso na minha frente se solidificou de uma maneira que tive de ser forte para quebrá-lo, no bom sentido, claro. Porém, abaixo do gesso havia uma armadilha. Meu pé enganchou em uma mochila jogada no chão e fui parar no gélido concreto da calçada, ferindo o joelho que já não é dos melhores, mas passo bem, obrigada! Apenas fico profundamente triste por saber que pessoas, principalmente as desprovidas de educação e noção, são como um frágil pedaço de gesso.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Marias mijonas

           Quase sempre choronas se desesperam por pequenas coisas, sujeitam-se a cada situação e sem a capacidade de exercerem uma simples opinião respondem um “tanto faz” a qualquer questionamento. Borram-se de medo dos metidos a machões e padecem em silêncio. Amedrontadas se calam diante da própria reputação e escondem suas marcas da vergonha alheia. Exibem traços de meninas indefesas e totalmente dependentes que não são. A realidade é que os covardes agressores dependem mais delas do que elas deles. Cegamente subordinadas, obedecem e não ousam denunciar os maus tratos, seja pelo medo de ameaças, seja pela falsa esperança de que o autor um dia cumpra o que prometeu, de que o ocorrido não irá mais se repetir... Sem fraldas e na miséria, marias mijonas arrastam a vida em sigilo. No secreto de seus rostos sofridos aparentam mais idade do que, de fato, possuem.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Ermo interior

Caminhei por cima das pedras e feri meus pés. Tive pensamentos ruins e proferi palavras das quais não ouso mencionar aqui. Acenei, mas não me viram. Chamei pessoas pelo nome e nenhuma delas me ouviu. Veio-me o desespero e chorei soluços de muitas impressões fiéis do meu espírito moribundo. Prossegui como se âncoras acorrentassem o resto de vontade que o meu corpo tinha de continuar. Abandonei o barco. Afoguei meus sonhos. Inconsciente, sonhei com a vida que reclamava. O agora me assola tanto quanto mereço pagar por meus murmúrios. Perdi o carisma e afastei de mim os que eu menos queria. Joguei para longe a razão e parti em pedaços o meu próprio coração, sem eira nem beira. Os reflexos da minha mente pouco se fazem nítidos e em mim habita a solidão. Mamãe, você é minha casa!

terça-feira, 6 de março de 2012

Saber tudo é não saber

          Isso não é nenhuma descoberta, mas as impressões de uma incongruência do comportamento humano. Não saber tudo é saber que tudo o que se sabe fez você saber tudo o que até hoje precisou saber. Os passeios dos sorrisos pelas ruas, ou mesmo a queda da lua na extensão noturna. Os caminhos dos corações das longínquas relações, ou também a ausência de um vazio que só lhe trouxe frio. Os resquícios do amor que foi transmitido, assim como as flores que desabrocharam colorindo amores e dores em dias especiais. Tantas outras coisas encorpam o saber e desmistificam seu real significado, por isso lhe peço um favor! Quando souber quando o saber esteve tão certo, avise-me para eu procurar não mais sabê-lo.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Baseado em fatos e fotos reais

Os dias passam pelos olhos como se eles tirassem uma foto de cada momento. Imagens ficam registradas, fixando que o presente jaz no passado. Histórias de alguéns que viraram filmes a partir de alguns relatos da curiosa rotina de um diário pessoal. Histórias de entorpecimentos que começaram pela base, queimaram a essência e consumiram uma visão já turva da vida e do mundo. Caídas na real, trazem cor ao rosto pálido e revigoram o corpo fatigado. A quase morte beira o pó da terra por inalar o pó químico das alegrias momentâneas, das brisas inconstantes, dos centavos perdidos em dívidas inimigas, de muito penar e não encontrar o próprio eu. Sem estabelecer uma autorreflexão, desconhece o significado da palavra amigo e vaga tão só na carência escondida no refletir de sua própria face. Outros da mesma espécie os preconceituam marginais.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Sinfonia das águas

          
                Num aperto intencional a armação se abriu e esticou a lona dobrável e impermeável no alta da cabeça. Logo se podia ouvir o som dos pingos com a queda interrompida na tenda que livrava quase todo o corpo da chuva. Rapidamente batiam na superfície e escorriam pela curva chão abaixo. Unidos no solo sem absorção formavam poças a cada desnível da rua e calçada. Os veículos transitavam velozmente e os sulcos dos pneus levantavam jatos de gotículas como uma breve neblina. Os 'splashs', os 'chuás', os 'tecs tecs' e 'shshshshshs' não deram trégua e são impressionantemente músicos destes dias chuvosos. O próximo aperto fez a lona dobrar e escorrer o excesso de água na sacolinha plástica, interrompendo a viagem agradável debaixo da queda das águas.