segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Eterna viagem

Por que quando se acaba de conhecer uma história vem o desejo de que muitos a conheçam também?

Durante essa viagem é normal pensar em alguns conhecidos, amigos ou pessoas muito próximas. Existe algo nas histórias que é possível associar com cidadãos ao seu redor. Relatos que se encaixam perfeitamente com experiências já vividas.
Ambientes são arquitetados, rostos traçados, situações elaboradas e ideias desenhadas em um único lugar, na mente. É incrível como a imaginação aflora! Ganha proporções das quais o ser humano só pode comprovar quando experimenta.
Às vezes algumas pessoas embarcam e esperam nunca atracar, pois o balanço provocado pelo mar e sua brisa suave lhe convidam a ser um eterno passageiro em busca de um tesouro que toda tripulação sonha encontrar. Navegam sem vontade de ver terra firme outra vez, prefeririam se perder em alguma ilha desconhecida do mapa. Também há aqueles que ao entrar em uma aeronave querem voar entre nuvens e permanecer no céu como se o combustível do transporte fosse infinito como o universo. Porque lá de cima todos podem transpor portas, paredes, até montanhas, e ir além do que os pés conseguem alcançar. Finalmente, existem pessoas que com um simples percurso de ônibus ou trem encontram o tempo necessário para realizar jornadas que ultrapassam as conversas alheias, papos informais, músicas inconvenientes e os irritantes sons das buzinas. O fato de ter em mãos um conjunto de dados rebuscados, sejam fictícios ou não, atrai todo bom amante de leitura, e o priva de seu sentido auditivo.
Viajar sem ter hora para voltar. É o sentimento provocado ao ler! O preço da passagem... É o que menos importa, porque no fim a bagagem aumenta significativamente. Um peso essencial na mala do conhecimento, o qual nenhum alfabetizado deveria dispensar.

sábado, 20 de novembro de 2010

A contumácia da porta

Ela: Não é ser uma pessoa negativa!
Ele: Ops! Começa com um ‘não’ e se considera positiva?

Ela: É que o ‘não’ nega que sou negativa, entende?
Ele: Perfeitamente, mas poderia dizer de outra maneira!

Ela: A questão é que sempre quando abro essa porta você me apronta alguma...
Ele: O problema é que você abre a porta sem minha autorização. Não peço para que faça isso!

Ela: Ah! Que ótimo! Agora, a culpada sou eu?
Ele: Pode até ser minha culpa, mas eu não deixo certas pessoas entrarem só porque você abre essa porta.

Ela: Entendo. E admiro isso. Porém, queria que me avisasse quando estivesse gostando da visita.
Ele: Sim, claro. Vou lembrar disso se você não for tão cortês e convidá-la para ficar!

Ela: Não faço por querer e não consigo explicar.
Ele: Está vendo! Mais uma vez você nega suas atitudes.

Ela: E você conhece outro modo?
Ele: Conheço. Seja mais você, deixe que eu a ame primeiro e mantenha a porta fechada até que eu oriente o contrário, porque quando você diz que eu apronto, na verdade, é a consequência que você se permite sofrer.

Ela: Eu sei que dói um bocado para você, imagine para mim, que além de sentir cada pontada penso em como poderia ser diferente...
Ele: É, mas até isso acontecer, fico com extrema melancolia e provoco efeitos em você dos quais não gostaria que vivenciasse.

Ela: Agradeço. Só posso agradecer por sua compaixão e compreensão. Resta-me criar uma senha para essa porta... E que esse código seja unicamente seu.
Ele: Acredito que seja impossível colocar uma senha nas escolhas que faz, mas pode ser cautelosa no abrir da porta e deixar o convidado na sala de espera, sempre observando seus modos perante sua presença. E eu garanto que quando você for cortês demais, saberei como agir, amiga!

Ela: Obrigada, amigo. Espero que as suas batidas melhorem depois da última porrada. Serei mais atenta com os convidados.
Ele: Você sabe que mais apanho do que bato. A última porrada foi quase um nocaute, mas estou aqui cambaleando para me recuperar saudável, pois quero que você fique feliz. Adoro ter um embrulho como você!

Ela: E eu adoro te embrulhar! Dê-me avisos verdadeiros daqui pra frente...
Ele: Pode deixar, querida. Amo sentir seu amor. Amo ser seu coração! Continuarei pulsando com alegria enquanto cuidar de mim.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Nota do tempo de uma lesma

      Hoje pela manhã, uma lesma invadiu meu lar. Ela conseguiu passar pelas pequenas frestas da janela da cozinha. Ela é totalmente desprezível, quando a coloquei na pá de lixo ela encolheu aquelas antenas ou olhos viscosos e horripilantes. Com tremenda vontade de jogar sal naquele molusco infeliz, devolvi o troço para natureza. Melhor, para o quintal, foi de onde ela saiu. Porque no quintal tem muitas plantinhas e com a terra úmida, o ambiente é ideal para ela ficar. Dessa vez, eu resisti não torturá-la com sal, porque um amigo, que estuda Gestão Ambiental, disse que ela é importante para natureza. Mas ela come todas as folhas, faz um tremendo estrago nas plantas e quando chove, invade a casa. Vai saber?! A próxima não terá a mesma sorte. Isso, eu posso garantir. Muahahahaha.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O tapete vermelho

          O que é uma celebridade vista do chão? Não é glamourosa tampouco vangloriosa.
      Desde que apareci, enfrento a sujeira e o pisoteio. Nem todos que passam por aqui são famosos ou poderosos. Pessoas comuns, simples cidadãos.
      Todos os dias recebo visitas, muitas pessoas me pisam e nem sequer notam minha beleza. Talvez porque essa mancha me desvalorize, porém é raro ver no chão algo natural como eu. Minha diferença é notável, dias estou mais claro, dias estou mais escuro, apareço sempre na primavera.
      Quando minha matéria-prima cai no chão forma um ‘splash’, se estiver madura, e se for pisada também. Por várias semanas sofri essas condições para chegar à tonalidade e vibração em que agora estou. Se deixar passar muito tempo, não me verá. Voltarei a ser daqui a alguns meses o que sempre fui: gelado e cinza.
      Eu poderia realçar a beleza de todos, mas nunca me dão a chance. Sei que vou chegar lá. E também reconheço que minha identidade fique para os mais próximos de mim, àqueles que passam por aqui todos os dias. Não me importo com os calçados simplórios e os passos apressados de quem não têm tempo para uma fotografia. Contudo, queria mais um pouco de admiração, mesmo que eu não conceda momentos de glória para eles. Pois são amoras na calçada...
      Amora madura, vermelha feito sangue, esmagada feito uva, quando preparada para o vinho. Elas tingem parte do meu concreto abaixo de sua árvore que, do outro lado do muro, nos fornece sombra.
      Eu sou o tapete vermelho de amoras, outrora colhidas.

Inspirada em uma das calçadas da Avenida Belmira Marin.